segunda-feira, 6 de julho de 2015

Inconstitucionalidade do Projeto de Emenda à Constituição 171



INTRODUÇÃO
O presente texto tem como finalidade apresentar pontos que tornam inconstitucional o projeto de emenda à constituição 171/1993 cujo assunto tratado é a redução da maioridade penal e alteração do artigo 228 da Constituição Federal de 1998.

   1. DA INCONSTITUCIONALIDADE E DOS PONTOS CONSTITUCIONAIS.
Segundo o procurador de justiça e autor Rodrigo César Rebello Pinho “inconstitucionalidade é incompatibilidade entre um ato legislativo ou administrativo e a Constituição Federal [...]”.[1]
As espécies normativas obedecem a certa hierarquia. O sistema jurídico, segundo a ótica da Teoria Pura do Direito redigida por Hans Kelsen possui uma forma piramidal cuja ponta é ocupada pela Constituição Federal, logo todas as demais espécies normativas, como as leis ordinárias, por exemplo, devem ser compatíveis a referido documento.
A Constituição tem tamanha importância porque é um documento que organiza todo um Estado, define um sistema político e de governo, traz em seu texto normativo os direitos e garantias individuais de cada membro do seu território de vigência, estabelece formas de alteração do seu próprio texto e dos atos legislativos criados e legitimados por ela. A respeito do parágrafo cumpre-nos citar mais uma vez Rodrigo César Rebello Pinho:

“Constituição é a lei fundamental de organização do Estado, ao estruturar e delimitar os seus poderes políticos. Dispõe sobre os principais aspectos da sua estrutura. Trata das formas de Estado e de governo, do sistema de governo, do modo de aquisição, exercício e perda do poder político e dos principais postulados de ordem econômica e social. Estabelece os limites de atuação do Estado, ao assegurar respeito aos direitos individuais. O Estado, assim como seus agentes, não possui poderes ilimitados. Devem exercê-los na medida em que lhes foram conferidos pelas normas jurídicas, respondendo por eventuais abusos a direitos individuais.”[2]

Após citação acima lhes chamo a atenção para o ponto ilimitado e respeito às normas constitucionais. O Estado e também os seus membros como funcionários concursados e políticos democraticamente eleitos para representar o povo devem seguir o que o texto da Constituição os atribui e responder por eventuais danos causados pela não observância de tais atribuições legais. Contudo para se propuser determinada emenda à constituição (espécies normativas que alteram o texto constitucional, logo se aprovadas terão importância de Constituição e serão superiores as demais espécies), o interessado deverá obedecer ao que está escrito taxativamente na Constituição Federal.
1.2  Conclusão do capítulo primeiro.
Após a leitura e reflexão do que nos foi abordado no presente parágrafo concluímos que a Constituição é uma norma superior às normas infraconstitucionais (hierarquicamente abaixo dela), que o próprio Estado e os seus membros devem segui-la (a subordinação do Estado à norma foi título de diversas lutas no passado), que a Constituição estabelece formas de manter o Estado e também de criar leis e que inconstitucionalidade é a não observância do que está expresso no texto Constitucional, logo não poderá ser vigente um ato normativo inconstitucional.

      2.     DAS EMENDAS À CONSTITUIÇÃO.
No parágrafo acima aprendemos que as emendas à Constituição têm o poder de alterar o texto da própria Constituição. Como o desejo é o de alterar a idade penal atribuída pela Constituição, este só será apresentado por um projeto de emenda à Constituição (PEC). Contudo a própria Constituição regula e limitada tal ferramenta. A respeito da limitação trago-lhes o texto da Constituição Federal:

“Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;

II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros
§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.

§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.

§ 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem. [...].[3] (grifos nossos)

Acima trago uma parte do artigo 60 da Constituição. Como dito no primeiro capítulo a Constituição Federal regulamenta formas de criar e revogar leis ou atos normativos. O seu texto é uma lei, logo pode ser revogado como qualquer outra lei infraconstitucional, entretanto o procedimento para a presente revogação é muito mais complexo que o processo de revogação das leis infraconstitucionais. O processo de alteração da nossa Constituição é classificado como rígido. A respeito de tal classificação citarei um trecho da obra Da Organização do Estado, dos Poderes e Histórico das Constituições, redigida por Rodrigo César Rebello Pinho.

a) Rígidas. Exigem um procedimento especial de alteração dos preceitos constitucionais mais rigorosos que o das demais normas infraconstitucionais. Exemplos: Constituição americana e todas as brasileiras republicanas. Pela atual, uma emenda constitucional para ser aprovada precisa de maioria de 3/5 (CF, art. 60,§ 2º), enquanto uma lei ordinária é aprovada por mais simples (art.47).”[4]

Após leitura do trecho é fácil percebermos o porquê de referida classificação. A alteração da Constituição Federal é mais obstaculizada porque dita e legisla sobre assuntos importantes que afetam diretamente e indiretamente o povo. Se mal alterada podemos vivenciar complicações em nossas relações pessoais e jurídicas.
Um ponto importante que devo apresentar é a não aceitação da iniciativa popular nas emendas. Outro fator é a necessidade números certos e taxativos de deputados, senadores (1/3) e membros da assembleia legislativa (1/2 +1 voto).
Prosseguindo com nossa análise do artigo 60, cumpre-me informa-los de outra parte do referido artigo. A inconstitucionalidade da PEC cujo tema é a redução da maioridade fundamenta-se no restante que será tratado abaixo. A iniciativa de trazer partes do artigo foi tomada visando apresenta a vocês o cuidado que a Constituição de 1988 tomou em relação às emendas à Constituição. Observe como ela deixa especificadas as pessoas que podem alterá-la, observe como é rígida.
Além de cuidar das pessoas e impedir alteração em determinados tempos. A Constituição também cuidou dos assuntos que jamais serão assuntos de emendas. Abaixo lhe exponho o restante do artigo:

“ [...] § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.”[5]

Repare que no texto acima realizei alguns grifos e são nestes pontos em que fundamento à inconstitucionalidade. Observe que o texto é claro “proposta de emenda tendente a abolir”. Isto assegura a não redução dos quatro itens e o ultimo refere-se aos direitos e garantias individuais.
O artigo 228 da Constituição Federal garante aos menores a imputabilidade penal. A referida imputabilidade é uma garantia concebida aos adolescentes. Se a PEC for aprovada teremos uma diminuição de referida garantia, logo teremos uma incompatibilidade com o artigo 60, §4, IV da Constituição Federal. A respeito do presente artigo redige René Ariel Dotti,:

“A inimputabilidade assim   declarada   constitui   uma   das   garantias fundamentais  da  pessoa  humana,  embora  topograficamente  não  esteja incluída  no  respectivo  Título  (II)  da  Constituição que  regula  a  matéria. Trata-se  de  um  dos  direitos  individuais  inerentes  à relação  do  artigo  5º, caracterizando,   assim,   uma   cláusula   pétrea.   Consequentemente,   a garantia  não  poder  ser  objeto  de  emenda  constitucional  visando  à  sua abolição  para  reduzir  a  capacidade  penal  em  limite inferior  de  idade  dezesseis  anos,  por  exemplo,  como  se  tem  cogitado. A  isso  se  opõe  a regra do § 4º, IV, do art. 60 da CF”[6]

2.1 Conclusões do capítulo segundo.
Após expor vários pontos concluo que a PEC 171 não é constitucional, pois litiga e contraria uma garantia dada aos adolescentes e expressa em norma Constitucional, haja vista que referido projeto diminui uma garantia individual. Diminuição essa não aceita pelo artigo 60,§ 4°, IV que limita assuntos tratados por emendas à Constituição.
   
3. CONCLUSÃO DO ARTIGO.
O artigo tratou de informa-los que a Constituição é um documento que se sobrepõe a todas as leis, é importante porque trata de assuntos essenciais para constituição e organização de um Estado, cuida de garantias individuais de cada cidadão e legisla sobre formas de sua alteração e das demais leis.
Além de entendermos a importância da Constituição vimos que a PEC 171 tem como foco a redução de uma garantia individual que segundo a Constituição não poderá ser objeto de emenda à Constituição, o que já é suficiente para não permitir que citada emenda entre em vigor seja convertida em texto constitucional.  



[1] PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria geral da constituição e direitos fundamentais. 9.ed.. São Paulo: Saraiva, 2009. v.17. 208 p. (Coleção sinopses jurídicas; v.17).
[2] PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria geral da constituição e direitos fundamentais. 9.ed.. São Paulo: Saraiva, 2009. v.17. 208 p. (Coleção sinopses jurídicas; v.17).
[3] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 04 de Julho. de 2015
[4] PINHO, Rodrigo César Rebello. Da Organização dos Estados, dos Poderes e Histórico das Constituições. 9.ed.. São Paulo: Saraiva, 2009. v.18. (Coleção sinopses jurídicas; v.18).
[5] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 04 de Julho. de 2015

[6]  René Ariel Dotti, Curso de Direito Penal: parte geral, Rio de Janeiro, Forense, 2001, p. 413.

sábado, 4 de julho de 2015

Crítica à Lei do Abate

INTRODUÇÃO.

O Brasil é um país onde o tráfico de drogas e de armas é uma realidade perceptível por qualquer cidadão comum. Não é raro assistirmos a um noticiário e encontrarmos notícias relacionadas aos referidos assuntos.
Visando repelir e conter o problema citado o país editou e promulgou uma norma que autoriza o abate de aeronaves consideradas hostis e que estejam no território nacional. O abate será feito após o piloto da aeronave desrespeitar a advertência e os tiros de aviso, contudo este ato é totalmente contrário aos direitos fundamentais e da pessoa humana, além de estabelecer conflitos com normas constitucionais cuja posição hierárquica é superior a Lei do Abate.

1.     PRINCÍPIOS FERIDOS.

O Estado brasileiro visa proteger à vida, garantir um julgamento justo, coerente e de maneira alguma aplicar sanções perversas e de morte em tempos de paz. As palavras ditas referem-se aos princípios constitucionais mais sérios do nosso país. Estes princípios são desrespeitados pela Lei do Abate que prevê o abate de aeronave hostil que esteja sobrevoando o nosso território.
Antes de avançar com o texto julgo necessário conceituar aeronave hostil segundo o §2 da Lei o Abate:
“2º Esgotados os meios coercitivos legalmente
previstos, a aeronave será classificada como hostil, ficando sujeita à medida de destruição, nos
casos dos incisos do caput deste artigo e após
autorização do Presidente da República ou autoridade por ele”


Como consta no texto da lei do abate, a aeronave que adentrar o nosso espaço aéreo em condições irregulares, manter um comportamento suspeito e recusar-se a comunicar-se com o caça esta será considerada hostil e deverá ser abatida. O abate contraria alguns princípios e normas da ilustre Constituição Cidadão de 1988 que trago abaixo:
1° Princípio da presunção da inocência: Este princípio garante que todos serão considerados inocentes até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, cabendo ao Ministério Público oferecer ao cidadão todos os recursos possíveis para se comprovar a inocência. O referido princípio baseia-se no artigo 5°,§ LVII:
[1]LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;”
A sanção aplicada na lei do abate é a queda da aeronave, cumpre-nos dizer que a referida pena viola do presente texto constitucional porque a autoridade não fornece ao suspeito nenhum julgamento e recurso, além de sentenciar o caso sem provas que condene o suposto réu;
2° O direito ao processo legal: A sanção aplicável no caso que trago não garante o processo ao suposto réu. O processo é um instrumento de grande importância porque é por meio deste que o cidadão acusado comprova a sua inocência através de inúmeros recursos. A respeito do processo a Constituição Federal traz o seguinte texto encontrado no Art. 5°, § LIV:
[2]LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;”
O processo é uma das garantias pessoais mais antigas que temos sendo assegurado pela Carta Magna da Inglaterra de 1215. O processo visa diminuir os abusos do Estado e no caso analisado o Estado não o garante ao executar a aeronave no local.
Como o referido caso não garante o processo, logo o mesmo retira da vítima os recursos futuros. A respeito da referida violação cumpre-nos citar o ilustre jurista alemão Rudolf Von Ihering:
[3]“A justiça tem numa das mãos a balança em que pesa o direito, e na outra a espada de que se serve para o defender. A espada sem a balança é a força brutal, a balança sem a espada é a impotência do direito.”

Com a retirada da defesa a lei do abate contribuiu para punições severas e injustas, consequentemente compromete a segurança imposta pelo Estado de Direito.

3° Violação do princípio da Proporcionalidade: em matéria de direito penal é defeso a aplicação de penas desproporcionais à conduta. A referida aplicação fere o princípio da proporcionalidade, pois não há em cogitar-se proporcionalidade em derrubar um avião cujos tripulantes são considerados suspeitos.

4° Pena inconstitucional: A Constituição traz consigo as seguintes penas:
[4]“XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;”
O abate é um exemplo de pena cruel que poderá ser convertida em pena de morte, pois a queda de um avião pode retirar a vida de seus tripulantes, caso não a tire é certo que violará a integridade física da pessoa humana. Abaixo traremos as penas permitidas para assim analisarmos e constarmos que não há aprovação constitucional para o abate.

XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará                                         ...........entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
Em nenhuma hipótese a Constituição autoriza penas como a estudada nesse caso, observe que a mesma é tão humana que se compromete a aplicar penas sociais, tais como ajuda às instituições humanitárias, trabalhos sociais, etc.
2.     Da solução ao caso.
Sabemos que as pessoas são afetadas direta e indiretamente pelo tráfico, mas a solução dada ao caso não deverá atingir diretamente a vida, a integridade da pessoa humana e os direitos fundamentas como o processo, a presunção da inocência e uma pena humana.
A nossa Constituição cuidou do assunto e os protegeu em seu texto, não deveria uma lei infraconstitucional abalar toda esta estrutura humanitária. O preâmbulo de nossa Constituição, muito embora não tenha força normativa, mas traz o resumo do que há no texto da Constituição que detém uma força normativa superior a toda legislação, nos diz o seguinte:
[5]Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.” (grifos nosso)
Acima foram grifados os princípios fundamentais e humanitários de nossa Constituição. Uma lei que autoriza uma pena cruel, uma lei que viola a integridade da pessoa, que viola o seu direito ao contraditório. O ser humano é um ser contraditório e pode se arrepender cabendo ao Estado atribuir-lhe condições necessárias e o tratar como pessoa humana, pois só assim poderá se arrepender do ilícito cometido.
Ao presente caso sugerimos uma punição mais humana que não desrespeite os direitos e garantias individuais.



[1] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 30 de Maio de 2015
[2] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 30 de Maio de 2015
[3] Rudolf von Ihering
[4] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 30 de Maio de 2015
[5] Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 30 de Maio de 2015